A busca por trabalho, a necessidade das famílias de levarem consigo os filhos para o trabalho ou a adoção de alguma estratégia de sobrevivente como “pedinte” são as principais razões que levam crianças e adolescentes do município de João Pessoa à situação de rua, segundo o “Diagnóstico da situação da criança e do adolescente do município de João Pessoa – Conhecer é proteger”, realizado pela ONG Casa Pequeno Davi e apresentado, esta semana, ao Ministério Público da Paraíba (MPPB).
O estudo organizado pelas pesquisadoras Anadilza Ferreira, Maria de Fátima Pereira, Roberta Souza e Valéria Soares e seus principais resultados foram discutidos em audiência promovida, na última quarta-feira (27/10), por videoconferência, pelo 33º promotor de Justiça de João Pessoa, João Arlindo Corrêa Neto (que atua na defesa da Criança e do Adolescente) com representantes e profissionais da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, do Centro de Referência em Assistência Social (Creas) e do Ruartes.
A publicação também passou a integrar o procedimento administrativo 002.2019.027062, instaurado na Promotoria de Justiça, em razão do crescente número de crianças e adolescentes nas ruas e com o objetivo de cobrar do poder público a elaboração e implementação de políticas públicas e ações governamentais intersetoriais capazes de resolver esse grave problema social. “Hoje, temos uma radiografia de um problema bastante complexo que vai nos permitir cobrar, de forma mais efetiva, o cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente e a implementação de políticas públicas”, disse o promotor de Justiça.
A apresentação do diagnóstico feito pela ONG Casa Pequeno Davi foi uma das deliberações da audiência realizada pelo MPPB em agosto deste ano. Esta semana, a problemática foi discutida com a coordenadora da Média Complexidade da secretaria municipal, Katiana Santos; com a representante do Creas, Andréa Coutinho, com a diretora da Assistência Social da secretaria, Benicleide Silvestre, e com a representante do Ruartes, Maria de Lourdes Silva. “Durante a audiência, foi possível promover o diálogo intersetorial para encontrarmos soluções para esse problema. Concluiu-se que seria pertinente abranger a discussão para outros atores da rede de proteção, como os conselhos tutelares e o CMDCA (Conselho Municipal de Defesa da Criança e do Adolescente) e por isso será designada nova reunião em data a ser definida para avançarmos nessa temática”, explicou o promotor de Justiça.
O diagnóstico
O diagnóstico sobre crianças e adolescentes do município realizado pela ONG Casa Pequeno Davi contou com o trabalho de 94 pesquisadores e cerca de 1,8 mil participantes. Os dados foram coletados em 2018 e 2019. Foram ouvidos representantes das redes de proteção e do Sistema de Garantias de Direitos de crianças e adolescentes, famílias, crianças, adolescentes, gestores, profissionais e instituições.
A pesquisa quantitativa e qualitativa traz um capítulo para falar sobre o perfil de crianças e adolescentes em situação de rua na capital paraibana. O estudo identificou, em dezembro de 2018, 619 crianças e adolescentes nessas condições, que passaram a ser monitoradas desde então pela rede de proteção.
O diagnóstico revela que essas crianças e adolescentes estão predominantemente em feiras livres (43,7%) e calçadas ou pontos de estabelecimentos comerciais (16,3%) de 23 bairros, a exemplo de Jaguaribe, Bairro dos Estados, Centro e também bairros da orla, como Manaíra, Tambaú e Cabo Branco, por exemplo. Destaca ainda que 34,5% deles estavam em logradouros públicos, definidos como circulação nas ruas, sem que ficasse nítida a base fixa de apoio.
Para os pesquisadores, a presença mais significativa de crianças e adolescentes em áreas de feiras e calçadas de estabelecimentos comerciais pode estar relacionada ao trabalho infantil. “Os dados evidenciam que pelo menos 61,9% dos participantes entrevistados informaram que estavam nas ruas em busca de trabalho e 9,1% estavam acompanhando a família no trabalho”, diz o estudo, acrescentando como outros motivos para essa situação a busca por alimentos e por esmola e a carência de políticas públicas para resolver questões como a necessidade de a família trabalhar e não ter com quem deixar os filhos.
Situação de rua
Conforme explicou o promotor de Justiça, a pesquisa também revela que a maioria dessas crianças e adolescentes tem família e que 85% informaram voltar para casa todos os dias. “Foram identificados quatro adolescentes vivendo nas ruas por razões, segundo eles, relacionadas à violência doméstica e familiar e que eles não querem voltar para as famílias de origem. Também não querem ir para instituições de acolhimento. Esses adolescentes estão sendo monitorados pela rede de proteção e estamos procurando os pais ou responsáveis até para cobrar deles também essa responsabilização”, explicou o promotor de Justiça.
Perfil das crianças e adolescentes em situação de rua em João Pessoa:
67,4% têm entre 7 e 15 anos de idade;,6% são do sexo masculino;
69,4% são negros;
25,8% não estudam e dos que estudam; 31% cursam o ensino fundamental I; 34%, o fundamental II; 6% o ensino médio;
46% das crianças e adolescentes entrevistados disseram estar na rua acompanhados de um adulto; 29% na companhia de outra criança ou adolescente; 15%, sozinhos e 9% encontravam-se acompanhados de um grupo de pessoas;
85% disseram voltar para casa todos os dias; 8,3% disseram voltar para casa só à noite e 6% permanecem por mais tempo nas ruas, o que pode indicar um processo de rompimento de vínculos familiares.
Fonte: “Diagnóstico da situação da criança e do adolescente do município de João Pessoa – Conhecer é proteger”, publicado este ano pela ONG Casa Pequeno Davi.
PB Agora