O ministro Marcelo Queiroga já havia rasgado o diploma de médico para não contrariar as ordens de Jair Bolsonaro. Agora quer transformar a vassalagem em capital eleitoral.
Ontem o doutor foi à Paraíba para a inauguração de um trecho atrasado da transposição do rio São Francisco. Sem máscara, subiu no palanque e fez discurso de candidato. Ele é cotado para disputar o Senado ou o governo de seu estado natal.
De colete verde-oliva, o aspirante a político se comparou ao conterrâneo Epitácio Pessoa, que governou o país na época da gripe espanhola. “O presidente Bolsonaro chamou outro paraibano para ajudá-lo a vencer a pandemia da Covid-19”, empolgou-se.
O ministro atacou governadores que tentaram driblar a demora do Planalto a comprar imunizantes. “Quantas vacinas eles trouxeram? Nenhuma”, provocou. Ele omitiu o fato de que o Consórcio Nordeste encomendou 37 milhões de doses da Sputnik V, mas o negócio foi barrado pela Anvisa.
Em tom de campanha, Queiroga endossou uma das mentiras contumazes do capitão: que seu governo não seria alvo de denúncias de desvio de dinheiro. Depois citou Jesus Cristo e disse que outro Messias, o Jair, vai “matar a sede do povo do sertão”.
Imodesto, o ministro ainda elogiou o próprio desempenho na pandemia. Esqueceu-se de mencionar o relatório da CPI da Covid, que pediu seu indiciamento pelos crimes de epidemia e prevaricação.
O documento lembra que Queiroga era crítico ao uso da cloroquina, mas mudou o discurso ao ganhar um cargo em Brasília. “Seus princípios se tornaram outros ao se tornar parte do governo Bolsonaro”, resume.
Para agradar o chefe, o ministro se cercou de negacionistas como Mayra Pinheiro, conhecida como Capitã Cloroquina. Seu comportamento desinformou a população e favoreceu a propagação do vírus, afirma o relatório.
A CPI também concluiu que Queiroga foi avisado do rolo da Covaxin, mas imitou Bolsonaro e cruzou os braços. O assunto costuma irritar o ministro, que já abandonou uma entrevista para não ter que comentá-lo.
Na quarta-feira, o doutor deixou claro que também não pretende prestar contas sobre os pedidos de indiciamento. “Não sou comentarista de relatório”, esnobou.
Bernardo Mello Franco – O GLOBO