Descontentes, militares de baixa patente vão às urnas contra generais

Descontentes, militares de baixa patente vão às urnas contra generais

A participação de militares da reserva na política, turbinada pela onda que elegeu o presidente Jair Bolsonaro, vai propiciar nas eleições deste ano um embate inusitado. Descontentes com os oficiais — generais e coronéis — que entraram para o Congresso em 2018 e também com aqueles que integram o governo federal, reservistas das Forças Armadas de baixa patente, os chamados praças, resolveram tentar a sorte nas urnas para defender seus próprios interesses.

Por todo o Brasil está em andamento a campanha “Praça vota em praça”, que orienta os fardados e seus familiares a escolherem candidatos que não sejam oficiais, mas de patente mais baixa.

As pré-candidaturas a deputado federal desses militares são mais numerosas agora que há quatro anos. O Rio de Janeiro, estado com maior número de fardados do país (são cerca de 289 mil deles, entre os da ativa, da reserva e pensionistas) é o epicentro desse engajamento. Este ano, há pelo menos 10 militares de baixa patente que postulam a candidatura, contra apenas dois que fizeram campanha em 2018.

O suboficial da reserva da Marinha José Bonifácio Bezerra Junior já se candidatou cinco vezes e na última eleição a deputado federal pelo Rio recebeu mais de 15 mil votos, mas não conseguiu se eleger.

“O número de praças que serão candidatos está mesmo maior, porque os oficiais abandonaram a gente”, diz Bonifácio, que pleiteia candidatura no Patriota.

“O movimento é muito grande para não votar em generais. Eles não fizeram nada por nós na ativa, agora querem se passar por bonzinhos para ganhar votos dos praças, que representam 85% das Forças Armadas”.

O principal motivo de insatisfação foram as mudanças no sistema de Previdência dos militares, efetivado em 2020 com aprovação da Lei 13.954/19, que privilegiou os oficiais e prejudicou os praças, especialmente os da Marinha e da Aeronáutica. Com a reforma, o desconto do pessoal da ativa e das pensionistas aumentou.

“Muitos desses oficiais foram na aba de Bolsonaro, como os deputados General Girão (PL), General Peternelli (União Brasil), o Coronel Chrisóstomo (PL) e não fizeram nada”, diz outro suboficial da reserva da Marinha, Wagner Coelho, que é pré-candidato fluminense a deputado pelo Podemos.

“Além disso, tentaram mudar o estatuto dos militares para dificultar a nossa chegada à esfera política e o nosso direito de expressão”.

Coelho avalia que tanto os parlamentares oficiais quanto os generais do Ministério da Defesa só pensaram em seus próprios bolsos.

“Na divisão dos recursos, 18%, os oficiais, ficaram com R$ 67 bilhões e os restantes R$19 bilhões foram divididos entre mais de 80% da tropa, que são os de baixa patente. Tem que acabar com esses privilégios”, defende.

Entre os candidatos que ele espera ver derrotado nas urnas cita o general Eduardo Pazuello, o ex-ministro da Saúde, que está agora na reserva e pode fazer campanha a deputado ou senador no Rio. “Um cara totalmente incompetente e subserviente”, classifica Coelho.

Em São Paulo, um dos que acompanhou de perto esse embate em Brasília foi Fabrício da Aeronáutica, um suboficial reformado da Força Aérea que é vereador pelo MDB de Guaratinguetá. Ele vai tentar um mandato de deputado federal este ano.

“Não ouviram as nossas vozes, apesar de termos levado nossas reivindicações à Câmara e ao Senado. Eles só beneficiaram a parte mais alta da hierarquia militar”, reclama Fabrício.

“Batemos de gabinete em gabinete e não encontramos respaldo em nenhum deles. Nenhum dos militares eleitos em 2018 que estão no Congresso nos representam”.

Fabrício inclui nessa lista o próprio presidente Jair Bolsonaro. “Esse projeto foi aprovado porque o governo passou o rolo compressor. Eu entreguei nossa lista de reivindicações nas mãos do presidente Bolsonaro com sugestões de solução. Ele não deu atenção”, conta.

“No cercadinho do Palácio da Alvorada, destratou praças que foram reivindicar”. Há pré-candidatos de baixa patente que preferem, porém, evitar críticas a Bolsonaro.

“Esse projeto saiu do Ministério da Defesa elaborado pelos generais e qualquer texto que viesse o presidente iria assinar, ele não quis se indispor com a pasta”, justifica Antonio Valmir Junior, suboficial da Aeronáutica, também da reserva, postulante à Câmara dos Deputados pelo PTB do Rio Grande do Norte. “Nenhum presidente vai contra projetos vindos do Ministerio da Defesa.

Alertado para o fato de que no organograma do governo é o presidente que manda no ministro da Defesa e não o contrário, Valmir Junior emendou: “Não tiro a culpa de Bolsonaro, mas a culpa maior é da Defesa. Algo parecido aconteceu no passado com Fernando Henrique”, diz. Além de amenizar os prejuízos da Lei 13.954/19, os candidatos citam plataforma variadas como a melhoria no atendimento de saúde, acesso a creche, elevação salarial, plano habitacional, mudança no Código Penal Militar e outros itens.

O que é unanimidade mesmo é a repetição do lema “Praça vota em praça” nos grupos de aplicativos de mensagens e em manifestações. “Nós não votamos mais em general”, afirma Valmir Junior.

UOL

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