Mais da metade das verbas bloqueadas pelo presidente Jair Bolsonaro alcançam o ministério do Trabalho e Previdência e o da Educação. Meio Ambiente, programas para indígenas e quilombolas e combate à violência contra a mulher também são afetados
O corte de R$ 3,18 bilhões determinado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) no Orçamento deste ano tem os ministérios do Trabalho e Previdência e da Educação como os mais atingidos, com uma tesourada conjunta de R$ 1,8 bilhão, mais da metade do total, conforme a Lei Orçamentária Anual (LOA), sancionada e publicada, ontem, no Diário Oficial da União (DOU). Para preservar gastos eleitoreiros e agradar ao Centrão, Bolsonaro preferiu cortar benefícios assistenciais, investimentos na educação básica, e verbas para pesquisa científica, para a proteção ambiental e combate a incêndios florestais e à violência contra a mulher.
No Ministério do Trabalho, que teve um corte de R$ 1 bilhão — praticamente um terço de todo o contingenciamento orçamentário —, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), perdeu R$ 988 milhões, dos quais R$ 709,8 milhões em programas para melhorar a administração do órgão. Na Educação, os cortes somaram pouco mais de R$ 800 milhões, e foram desde o apoio para o desenvolvimento da educação básica em âmbito nacional, incluindo a aquisição de veículos escolares, até o fomento à pesquisa científica, extensão e inovação das instituições de ensino superior e de educação profissional e tecnológica. Praticamente metade desse montante foi contingenciada no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
O fato de o governo não dar justificativas plausíveis para os cortes chamou a atenção de especialistas, que não pouparam críticas às medidas eleitoreiras. “Investimento em pesquisa e na educação básica são fundamentais para um país. Estudos comprovam que é onde há mais retorno em termos de gastos na atividade econômica, mas o governo preferiu blindar o fundo eleitoral e as emendas do relator, que são gastos de curto prazo, sem impacto na economia”, lamentou a especialista em contas públicas Juliana Damasceno, da Tendências Consultoria. “O governo preferiu gastar mais com financiamento de campanha do que com educação. Isso é um indicativo de falta de planejamento e de que o governo está focado em gastos de curto prazo, a fim de atender as demandas do Centrão, do que despesas meritórias como saúde, educação e gestão ambiental”, emendou.
No Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), a tesourada de Bolsonaro ficou perto de R$ 460 milhões, com destaque para os R$ 122 milhões previstos na implantação do projeto Sul-Fronteira, em Mato Grosso do Sul.
O presidente resolveu limar até os recursos no combate à violência contra as mulheres do Ministério da Mulher e Direitos Humanos. Os cortes na pasta somaram R$ 16,5 milhões. E, no Ministério da Cidadania, nem mesmo os programas de assistência social ficaram de fora dos cortes, como o de estruturação da Rede de Serviços do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o Benefício de Prestação Continuada (BPC) à pessoa idosa e a Renda Mensal Vitalícia (RMV) por idade. A redução de gastos total na pasta ficou pouco acima de R$ 260 milhões.
Os cortes mais expressivos no Ministério da Agricultura foram no fomento ao setor agropecuário, de R$ 42,9 milhões, além da redução de recursos para órgãos coligados. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), por exemplo, teve cortes de R$ 43,8 milhões em programas de pesquisa para o desenvolvimento de tecnologias e inovação. Já o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) perdeu R$ 85,9 mil para o reconhecimento e indenização de territórios quilombolas e o mesmo valor para a consolidação de assentamentos rurais.
O Ministério de Infraestrutura sofreu cortes de R$ 177,8 milhões, principalmente, em obras rodoviárias. Já o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações sofreu cortes de pouco mais de R$ 10 milhões no financiamento de pesquisas de desenvolvimento científico e formação de capacitação.
Tesourada na saúde pública
Nem mesmo o Ministério da Saúde foi poupado nos cortes do Orçamento de 2022 e recebeu uma tesourada de pouco mais de R$ 70 milhões, com destaque para o contingenciamento de R$ 11 milhões para pesquisas e desenvolvimento tecnológico da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). A entidade é responsável pela produção da vacina contra a covid-19 da AstraZeneca no Brasil e credenciada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para produzir a matéria-prima do imunizante em território nacional.
Outros R$ 40 milhões de recursos da pasta para a melhoria de serviços de saneamento básico em pequenas comunidades rurais e quilombolas também foram limados pelo presidente.
No Ministério da Justiça e Segurança Pública, houve cortes nas despesas com a defesa do consumidor, de R$ 429,8 mil, e nos recursos para regularização e demarcação das terras indígenas e proteção dos povos mais antigos do país do orçamento da na Fundação Nacional do Índio (Funai), que somaram R$ 1,6 milhão. A principal tesourada da pasta,no entanto, ocorreu nos cursos para a formação de novos policiais, de R$ 52,7 milhões.
Incêndios florestais
A fiscalização nas alfândegas e a proteção ambiental também foram prejudicadas pelos cortes de Bolsonaro na Lei Orçamentária Anual (LOA) deste ano. O Ministério do Meio Ambiente sofreu cortes nas estratégias de preservação ambiental e recuperação da biodiversidade, incluindo a prevenção de incêndios em florestas. Ao todo, a tesourada da pasta girou em torno de R$ 35 milhões. Já o Ministério da Economia suprimiu R$ 85,8 mil para a auditoria e a fiscalização aduaneira.
O incentivo para a geração de energia renovável e o Programa Nacional de Biocombustíveis (Renovabio) foram os sacrificados no Ministério de Minas e Energia, que teve R$ 11,4 milhões das despesas reduzidas. Apenas na Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), estatal subordinada à pasta, a tesourada foi de R$ 7,8 milhões nos gastos com levantamento geológico e integração geológica.
O Ministério da Defesa sofreu cortes nos programas de blindados e de submarinos convencionais, assim como a implantação da infraestrutura para o Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE), somando pouco mais de R$ 61 milhões em redução de despesas. Curiosamente, entre elas, há uma rubrica de “caráter sigiloso” que sofreu corte de R$ 85,9 mil — número que aparece em cortes de outras pastas com frequência.
Correio Braziliense Foto: Poder360